Ah, esse livro. Começa pelo título.
Eu nunca tinha ouvido falar dele, mas quando vi esse título pensei: “Que
poético! Deve ser lindo!”. E é. Há que se reconhecer que a ideia para o nome do
livro não foi da autora, mas da editora do livro. Carson McCullers queria chamá-lo O Mudo, referência a um dos personagens
centrais da história (também sabemos que não existe a condição de mudo por si
só; se a pessoa não fala é porque não ouve).
Bem, a história se passa no período
entre a Grande Depressão e a Primeira Guerra Mundial numa cidade no sul dos
Estados Unidos ainda muito marcada pelo preconceito racial e sofrendo com a
crise socioeconômica. Cinco personagens principais vão sendo apresentados: John
Singer (o mudo), Mick Kelly (garota de 12 anos, filha do dono da casa em que alguns personagens alugam quartos e
onde muitas cenas se desenrolam), Dr. Copeland (médico, homem negro que segue
sua missão, seu propósito ao atender a população negra e acaba ele mesmo
descuidando de sua saúde), Jake Blount (morador que parece estar de passagem,
cheio de mensagens de cunho marxista) e Bill Brannon (dono do bar e restaurante
em que muitos personagens bebem e comem e que também é palco de muitos
acontecimentos dessa história).
O livro trata de alguns temas:
Solidão: ao mesmo tempo que há
bastantes acontecimentos na história e interação entre os personagens, os cinco
principais são extremamente solitários e parecem viver uma história à parte.
Como diz Mick, eles vivem muito no mundo de dentro (o mundo dos seus próprios
pensamentos) e só vivem o mundo de fora quando algo que acontece ali os afeta
ou eles tem que agir sobre isso.
Ponto de vista: cada um dos cinco
personagens principais tem suas teorias sobre a vida, sobre o mundo, sobre o
amor, os relacionamentos, sua missão e isso fica evidente nos monólogos
internos. Não necessariamente, os pontos de vista deles convergem, ao
contrário.
Comunicação/O Mudo: Singer é figura
central dessa história. Ele se comunica pela língua de sinais, mas seu outro
amigo surdo-mudo, o grego Antonapoulos, acaba internado em uma casa para
pessoas com distúrbios psiquiátricos. Ele lê lábios e escreve bilhetes para se
comunicar com outros personagens, mas na maioria das vezes apenas ouve. Como
ele se expressa pouco, os outros personagens todos recorrem a ela para contar
suas lamúrias, pois ele é quem vai ouvir e pouco ou nada criticar ou debater.
Ou seja, é uma forma de validação da visão de mundo de cada um. Eles também
consideram Singer a melhor pessoa, que compartilha das mesmas ideias, o melhor
amigo, enquanto Singer tem opiniões um pouco diferentes dos seus colegas. Acaba
se mostrando bastante crítico de suas atitudes. Seu verdadeiro amigo é o grego.
Talvez a mensagem central seja de que
é possível conviver e coexistir mesmo tendo opiniões tão contrárias sobre
certas coisas; que a busca da unanimidade de opiniões seja completamente
desnecessária e que a vida é um eterno exercício de tolerância, mas que isso
também não deveria ser tão difícil ou doloroso. Deveria ser normal.
Os menos sensíveis ou menos atentos,
digamos, dirão que o livro é sobre nada em especial, mas é aí que se enganam.